1) O que muda no papel: uma revolução técnica calculada
A Fórmula 1 de 2026 não será apenas uma atualização estética ou uma transição verde — é uma reinvenção estrutural do carro moderno. No coração do novo regulamento, a FIA e as equipes aprovaram mudanças profundas nos Power Units (PU), aerodinâmica, dimensões e peso mínimo.
Power Unit (PU)
O motor continua sendo um V6 turbo-híbrido 1.6L, mas a proporção de potência elétrica sobe de ~120 kW (160 cv) para 350 kW (470 cv).
A parte térmica (ICE) deverá entregar cerca de 400 kW (~540 cv), uma queda de aproximadamente 30% comparado aos atuais 550–600 kW. Assim, o total estimado de potência combinada ficará entre 1.000 e 1.050 cv, mas com mais dependência do boost elétrico para atingir o pico.
O MGU-H (unidade que recupera energia do calor do turbo) será removido — para simplificar custos e reduzir complexidade. Com isso, o turbo volta a ter lag mecânico maior, obrigando as fábricas a investirem em turbos de resposta ultrarrápida e geometrias variáveis.
Todo o combustível deverá ser 100% sintético, zero carbono, produzido via processos de captura de CO₂ e energia renovável, o que força as petrolíferas parceiras (Shell, Petronas, ExxonMobil) a investirem em blends experimentais de alta octanagem para suportar compressão extrema e prevenir detonação.
Aerodinâmica
O carro será desenhado para perder downforce deliberadamente — estimativas apontam uma redução de até 30% na pressão aerodinâmica total, o que diminui a aderência, principalmente em curvas de alta que dependem do pacote aerodinâmico do carro.
O arrasto aerodinâmico (drag) também será cortado, ajudando a compensar parte da perda de eficiência energética e facilitando maior velocidade final em retas.
O efeito solo (ground effect) ainda existirá mas carros vão passar a depender menos deles. Promete-se também que o “ar sujo” gerado pela aerodinâmica dos carros seja mais fraco, o que pode ajudar nas disputar por posição nas corridas.
Dimensões
Largura máxima do chassi cairá de 2.000mm para cerca de 1.900mm, devolvendo ao carro um estilo mais das antigas.
Entre-eixos mais curtos, promovendo maior agilidade em circuitos travados.
Peso mínimo volta a baixar: objetivo é ficar na casa de 768kg (sem piloto nem combustível), contra os 798kg atuais — alívio que juntamente aos aspectos aerodinâmicos traz de volta um comportamento mais “nervoso” em frenagem e mudança de direção.
2) Velocidade e comportamento esperado: mais potência, menos apoio, mais erros
Essa nova combinação cria um paradoxo intrigante: os carros de 2026 devem ser mais rápidos em retas, mas mais lentos em curvas de alta, especialmente nos primeiros anos de adaptação.
Expectativas concretas:
Retas: Ganho de até 10-12 km/h em circuitos como Monza e Baku, graças ao torque instantâneo do MGU-K expandido e da flexibilização das asas dianteiras e traseira de forma natural.
Curvas de alta: Perda de até 8–10% de velocidade de contorno em corners icônicos como Copse (Silverstone) ou 130R (Suzuka).
Tempo de volta total: Estima-se uma regressão de 5% a 7% na média geral dos circuitos tradicionais, recuperável ao longo do ciclo de desenvolvimento (2026–2028).
O piloto enfrentará um carro menos plantado — mais suscetível a sair de frente na entrada de curva e traseira solta na saída, sobretudo em situações de frenagem tardia ou pneus frios. A leitura de pista volta a ser mais humana e menos dependente de downforce excessivo.
Além disso, o gerenciamento da bateria passa a ser um jogo mental crucial: não basta acelerar — é preciso saber quando gastar o boost para atacar ou defender, sem ficar vulnerável em voltas seguintes.
3) O novo manual de pilotagem
Com menos apoio aerodinâmico, maior potência híbrida intermitente e um turbo menos previsível, a F1 2026 vai exigir uma pilotagem diferente da que vemos atualmente, com microcorreções constantes como no passado. Pilotos precisarão equilibrar a gestão térmica, a regeneração de energia, balanço mais arisco e a degradação de pneus em um carro que muda de comportamento constantemente.
Os engenheiros projetam que os erros visuais — como blocagem de roda, contraesterço e saídas de traseira — devem voltar a ser parte da paisagem da F1 moderna, dando mais espetáculo ao público e revelando quem realmente sabe controlar um monstro com menos aderência e mais torque.
4) Bastidores da guerra invisível: o campeonato já começou
Enquanto as corridas de 2025 seguem na TV, engenheiros de Milton Keynes, Brixworth, Maranello, Viry-Châtillon e Neuburg passam madrugadas rodando CFD, simuladores dinâmicos de túnel de vento e bancadas de PU, buscando cada décimo de vantagem para 2026.
Audi e Red Bull Powertrains lideram a ousadia nos turbos, Mercedes investe pesado em mapeamento de combustíveis sintéticos com a Petronas, enquanto Honda (via Aston Martin) aposta em materiais supercondutores para aumentar a eficiência do MGU-K.
Essa disputa técnica, longe do grid, definirá quem entrará forte na nova era — e quem repetirá o fiasco de 2014, quando alguns carros sequer terminavam uma corrida inteira.
Estamos prontos para uma Fórmula 1 em que cada erro é punido, a ultrapassagem é mais orgânica e a genialidade do piloto volta a pesar mais? O futuro da categoria está em jogo — e a guerra já começou, bem atrás da cortina de fibra de carbono que cobre esses carros.
*Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do BandSports.