O bicampeonato de Ayrton Senna na Fórmula 1 completa 35 anos nesta terça-feira, 21. Mas o roteiro daquela temporada de 1990 começou a ser escrito um ano antes, no mesmo GP do Japão.
Em 1989, Senna precisava superar o então companheiro de McLaren, Alain Prost, que buscava o tricampeonato após se consagrar em 1985 e 1986. Em Suzuka, o brasileiro teria de vencer para manter viva a chance do título. E venceu… mas a vitória foi tirada dele.
O jornalista Reginaldo Leme, que cobria a corrida em Suzuka, relembrou a tensão nos bastidores.
“Teve aquela celeuma toda da chicane. Não tinha certeza se haveria desclassificação. Uma coisa ficou certa [no briefing]: não poderia voltar na contramão. E, bom, ele seguiu embora, foi empurrado, que está dentro da regra que se o carro estiver parado e os comissários empurrarem, e ele pegar sozinho, pode continuar.”
Senna foi desclassificado por “cortar a chicane” ao retornar à pista. O título de 1989 ficou com Alain Prost.
“Desci da cabine e fui lá para a torre. Entrei por uma escadinha do lado. Estou vendo de um lado os comissários e o [Jean-Marie] Balestre [então presidente da FIA], estou vendo do outro lado o Senna com os pés em cima da mesa, pensativo, olhando para o infinito. Falei, ‘bom, a coisa deve estar feia mesmo, e ele está sabendo que vai ser duro reverter'”, relembrou Reginaldo.
A guerra contra o “sistema”
O resultado acendeu em Senna um sentimento de injustiça. Ele acusou publicamente Balestre, francês como Prost, de manipulação. A FIA reagiu e ameaçou não conceder a superlicença do brasileiro para a temporada de 1990, exigindo uma retratação pública.
Ayrton, irredutível, cogitou ficar um ano fora das pistas. “O Senna estava tão decidido, ele era tão firme em manter a posição dele que poderia, sim. A gente cogitava a possibilidade de ele ficar um ano fora e voltar”, explicou o jornalista.
No fim, a McLaren, sob influência de Ron Dennis, distribuiu um comunicado assinado por Senna, contra a vontade do piloto. A licença foi liberada, mas a mágoa permaneceu.
“Para ele valia o que ele estava achando, que tinha sido perseguido, que era uma coisa premeditada. Aquilo foi o que ele chamou de sistema. O sistema, ninguém pode ir contra o sistema”, recordou Leme.
A vingança
A temporada de 1990 redesenhou o grid: Prost foi para a Ferrari e Senna permaneceu na McLaren. A disputa foi acirrada, com vitórias de Senna em Phoenix e Mônaco, e vitórias espetaculares de Prost, como a do México, onde largou em 13º.
O destino levou a decisão novamente para Suzuka. A matemática era simples: Prost precisava vencer. Se o francês não pontuasse, Senna seria campeão, independentemente do seu resultado. “Se os dois saíssem, o Ayrton era campeão”, resumiu Leme.
A tensão explodiu no sábado de classificação. Senna cravou a pole position. Historicamente, o pole largava do lado interno da pista, que em Suzuka era o lado mais limpo e com melhor aderência. Naquele ano, porém, a direção de prova, sob influência de Balestre, inverteu a posição, colocando o pole no lado sujo.
“Ah, ele estava injuriado com essa decisão. Botaram ele por dentro da curva, só que lá esse dentro da curva é o lado mais sujo da pista. Seguiram a regra, mas não seguiram o bom senso. Aquilo ajudou a fervura que já estava dentro dele”, contou Reginaldo.
Para Senna, era a confirmação final da perseguição do “sistema”. Leme acredita que a decisão foi tomada naquele momento. “Acho que nessas ele tomou aquela decisão que, mais tarde, a gente veio a saber […] que provavelmente estava já na cabeça [dele].”
Domingo. Luzes verdes. Prost, do lado limpo, larga melhor. Senna, logo atrás, mantém o pé no acelerador e não freia para a primeira curva. A colisão foi inevitável. Fim de prova para ambos. Ayrton Senna era bicampeão mundial.







